Acontece com as obras de arte, acontece com joias e até com os filhotes vendidos nos Pet Shops, a mesma pergunta sempre precisa ser respondida: É verdadeiro ou falso?
Não existe meio termo, nenhum dos exemplos citados acima, pode ser meio verdadeiro.
Mas e quando a autenticidade a ser questionada é a de um ser humano? Será que as coisas funcionam da mesma forma? Poderia existir alguém meio verdadeiro?
Bom, vamos começar por aquilo que acredito ser a autenticidade em um ser humano. Acredito que ela só exista quando se é autêntico em suas emoções, principalmente naquelas que estão em nossa essência. Seguindo as pesquisas da Análise Transacional, tristeza, amor, medo e a raiva, são as 4 emoções essenciais, todas as outras estão ligadas a elas, por são consideradas secundárias.
Ninguém pode ser autêntico se não é capaz de viver suas tristezas, mesmo nesse mundo que cobra que sejamos felizes todo tempo, temos sim que nos permitir ficar tristes, isso é autenticidade. Ficar tristes com aquilo que nos deixa tristes, não demonstrar tristeza só para fazer parte da tristeza coletiva.
Tremer diante de algo, ter medo e reconhecer esse medo, afinal não somos feitos de aço. Importante lembrar que a natureza nos deu o medo para nos proteger, temos um sistema de sensores que está programado para acioná-lo, toda vez que algo não for considerado totalmente seguro para nós ou para alguém com quem nos preocupamos.
Sentir raiva, de vez em quando se exaltar um pouco, isso pode ser considerado falta de controle, mas é pura autenticidade.
Amar alguém e, deixar de lado aquela pose de durão, o importante é ser esse amor, deixar o amor tomar conta um pouco, isso também é ser autêntico.
Outra grande questão que me veio à cabeça quando estava escrevendo esse texto, foi respondida pelos conceitos das teorias do notório Jacob Levy Moreno, das quais gostaria de destacar uma parte que vem ao encontro do tema deste texto, a Teoria dos Papéis.
Foi nesta teoria, que encontrei a resposta para um dilema: Seria possível ser autêntico cem por cento do tempo?
Segundo Moreno, cada homem carrega um palco sob seus pés e é sobre este palco, que ele interpreta vários papéis, os quais passam a ser interpretados conforme a exigência de cada situação. Uma pessoa tem vários papéis em sua vida. Ela tem o papel de filho, de marido ou esposa, um papel no ambiente de trabalho, no clube, etc. Neste momento você deve estar fazendo a mesma pergunta que fiz, no momento em que comecei a tomar contato com essa teoria: Agir de uma forma em cada situação ou lugar, não seria um atestado de ausência da autenticidade?
Pois é, fui convencido de que não é bem assim e vou tentar explicar os motivos que me convenceram a pensar diferente. Imagine um homem que seja o presidente de uma multinacional, seja também o pai de duas lindas menininhas e além disso, nos finais de semana ele entra em campo para defender as cores do clube que frequenta, na nobre posição de goleiro do time de futebol de campo da associação. Neste exemplo vamos isolar apenas três dos vários papéis que ele interpreta em sua vida, não vamos conseguir abordar os outros incontáveis papéis que ele mantém disponíveis para outras situações.
Nesses três importantes papéis, vamos destacar o relacionamento interpessoal, comparando as diferenças que cada um desses papéis apresenta diante de situações de certa semelhança.
Quando alguém comete um erro que causa um enorme prejuízo:
Uma de suas filhas quebra aquele vaso egípcio raríssimo, que valia alguns milhares de dólares, com um chute bem no meio do vaso, este ato foi feito meio que de propósito, após seu pai solicitar que a televisão fosse desligada, uma vez que havia chegado a hora de dormir. Nosso amigo, em seu papel de pai, reagiu a esse fato com uma conversa firme com sua filha e a colocou em um castigo de uma semana sem assitir televisão.
Na empresa, um funcionário descontente com sua avaliação de desempenho, teve um ataque de fúria, ao saber que não iria receber seu tão sonhado aumento salarial, uma vez que não havia atingido seus objetivos anuais e, nesse ataque acabou chutando uma cadeira, que foi de encontro a uma estante de prêmios recebidos pela empresa, o que destruiu muitos deles ao caírem no chão. Nesse caso, no papel de presidente da empresa, ele não teve dúvidas, chamou o funcionário em sua mesa e solicitou ao departamento pessoal, que providenciasse o desligamento do funcionário por justa causa. Não podia admitir uma atitude como esta no ambiente de trabalho.
Na partida de futebol do final de semana, nosso goleiro foi expulso do jogo, após um bate-boca que manteve com um dos zagueiros de sua própria equipe, que falhou no último dos três gols que nosso amigo sofreu naquele jogo. Me parece que no papel de goleiro, ele não costuma pegar leve não.
As três situações tiveram reações bem diferentes, onde o mesmo homem viveu três papéis diferentes, mais importante que as reações em cada um destes casos, foi o fato de ele ter sido o mesmo diretor em cada uma dessas atuações. Ninguém dirigiu sua reação, ele agiu conforme seus valores e não deixou de viver as emoções que cada ato provocou.
O pai não mandou a filha embora de casa, o presidente da empresa não colocou o funcionário de castigo, muito menos o goleiro chamou o departamento pessoal, para soltar os cachorros sobre o colega de time. Não cabe a nós o julgamento destas reações, para alguns elas podem ser desproporcionais e até mesmo incoerentes, o que importa neste momento é que elas foram autênticas, cada papel ficou em seu devido lugar. Imaginem vocês, se nosso personagem, tivesse reagido da mesma forma nas três situações? Se ele tivesse adotado a mesma postura adotada com o colega do futebol com sua filha e funcionário? Os rumos seriam bastante diferentes e os efeitos catastróficos. Com sua filha, ele criaria um possível trauma, com o qual ela teria que conviver por boa parte de sua vida, ou até mesmo sua vida inteira, com certeza umas boas horas de terapia seriam necessárias. Com o funcionário nervosinho, ele com certeza iria responder por um processo de assédio moral, iria gastar muito mais do que o valor gasto para arrumar a prateleira que foi quebrada. Me veio à cabeça nesse momento, aquelas empresas que chamam o Bernardinho, com a finalidade de modelar seu quadro de liderança, acho que estão apresentando um papel fora do enredo do palco em que seus líderes atuam, mas não vamos entrar nessa questão aqui.
Por fim, pude concluir que não estou deixando de ser autêntico, por não ser tão racional quanto sou no trabalho, no relacionamento com minha esposa. Ou por não estar sendo tão emocional quanto sou com minha esposa, em meu ambiente de trabalho, isso realmente não vai me transformar em alguém verdadeiro ou falso. Agir assim, simplesmente me adequa a cada papel que tenho que desempenhar no grande teatro de minha vida, na verdade o que mais importa, é que em todos esses papéis eu consiga imprimir o meu DNA, imprimir os meus valores, a minha forma particular de ver e sentir o mundo, assim eu não sou somente o ator, assim me torno também o grande diretor de todo esse grande elenco que faz parte do meu ser.
Até a próxima, pessoal.
André L. G. Ferreira, Coach certificado pela International Coaching Community, Administrador e especialista em Qualidade.