Quando somos crianças somos grandes, determinamos metas desafiadoras na nossa vida, acreditamos que tudo pode dar certo. Lembro que quando criança já me imaginava no consultório atendendo meus pacientes, casando-me com 23 anos, tendo filhos, um casal; e de compartilhar todas essas projeções e imagens com minhas colegas de escola.
Quase 20 anos depois, reencontrando amigos do colégio, todas essas lembranças vêm à tona e parei para me perguntar: será que a Sabrina que conviveu com essas pessoas há 20 anos continua a mesma pessoa? Quem somos realmente? O passado que construímos, o agora que vivenciamos ou o futuro que planejamos?
Se pensarmos em termos de traços de personalidade, por exemplo, a extroversão ou introversão, de acordo com a psicologia, algumas teorias indicam que certa parte de nossa personalidade nasce conosco, se desenvolve durante a infância e se consolida na adolescência, aquela parte da vida na qual os adolescentes costumam andar em bandos e tribos estranhas e com as emoções à flor da pele, o que costuma assustar os adultos que observam ao redor. Mas tudo isso faz parte da formação da personalidade de cada um, então não sinta vergonha ao se lembrar desses fatos, o que você é hoje é fruto de tudo isso que viveu no passado.
Então quer dizer que nossa personalidade não muda? Não, em sua essência não. Eu que trabalho com processos de assessment (aplicação de um conjunto de ferramentas para avaliar o potencial de uma pessoa para ser liderança) em empresas há mais de dez anos, sempre ressalto essa questão com as lideranças e os denominados high potentials. A personalidade não muda, o que acontece é que passamos a nos adaptar ao meio em que vivemos e temos a oportunidade de desenvolver competências para lidar com as situações de conflito, negociações e nos relacionamentos com os demais.
Sendo assim, como podemos pensar em desenvolvimento, se parte de nós é ‘imutável’?
Nós, seres humanos, somos muito mais que nossas características de personalidade, existem outros fatores que nos constituem e que são essenciais para determinar quem somos: valores, crenças, sentimentos, conhecimentos e, claro, as experiências que vivenciamos, e que, por exemplo, nos fazem desenvolver competências diferentes das quais possuíamos há 20 anos atrás. Pense em seu primeiro emprego, qual era sua principal motivação: fazer o que gostava, ter o salário garantido no final do mês ou ser reconhecido? E hoje, o que você valoriza, são as mesmas coisas? No seu trabalho atual, sua autoconfiança é a mesma que você tinha no primeiro dia de trabalho? Isso tudo faz parte de nosso desenvolvimento como ser humano.
Saber quem sou, quais são meus valores, o que me motiva. Essa reflexão faz com que estejamos constantemente repensando nossos caminhos e construindo melhores oportunidades a cada dia, uma vez que isso se transforma a cada nova experiência que vivenciamos diariamente.
Tenho acompanhado através dos processos de coaching muitos profissionais que continuam fazendo o mesmo trabalho, na mesma empresa há muito tempo e hoje procuram o coaching para compreender o porquê esse trabalho de vinte anos atrás não o motiva mais. Algumas pessoas dizem que ficar tanto tempo no mesmo lugar é conforto, a famosa zona de conforto, eu particularmente acredito que existe algo que ‘conecta’ a pessoa àquele trabalho ou ambiente há tanto tempo, algo que ela acredita, que ela ganha em troca, algo que a faz continuar nesta relação com o trabalho ou a empresa. Buscar descobrir o que a manteve tanto tempo no mesmo lugar e o que a faz deixar de querer estar lá, abre caminho para avaliar novas oportunidades de forma mais consciente e assertiva, sabendo o que buscar.
Desta forma, não se sinta inadequado se alguns questionamentos surgirem depois de muitos anos realizando os mesmos projetos ou o mesmo trabalho, isso é muito saudável, quer dizer que você está em busca de algo melhor! Mesmo que sua decisão seja continuar no mesmo lugar. Conhecer os valores e crenças que hoje o motivam é um grande passo para seu autoconhecimento, para descobrir a pessoa que você é hoje.
Acredito que a grande beleza da vida é a possibilidade de evolução e transformação do ser humano. Sim, é possível preservar tudo que se tem de bom: traços de personalidade, valores, crenças, e criar uma série de possibilidades que transformem tudo isso em algo que te beneficie cada vez mais.
Quanto a mim, me casei aos 27 anos, não tenho filhos, tenho a oportunidade de contribuir para o desenvolvimento das pessoas em lugares distintos (físicos e virtuais) e, embora com os mesmos traços de personalidade e preservando alguns valores fundamentais, acredito que encontrei pessoas e oportunidades para dar um passo cada vez mais adiante do meu autoconhecimento e evolução, estando certa de onde quero chegar, pois ainda tenho aquela crença de criança, que tudo pode dar certo. O que aprendi é que isso ás vezes acontece não da forma que imaginei, mas mesmo assim contribui para minha evolução. Hoje, sou mais do que era antes. E, no futuro, serei mais do que sou hoje.
Sinto muita gratidão por ter essa oportunidade de reencontrar pessoas que foram muito importantes para a construção do que sou hoje, e que ainda poderão contribuir para o que posso ser no futuro.
Até logo!
Sabrina Green, Psicóloga, Coach certificada pela International Coaching Community e especialista em Recursos Humanos.