Quando procuramos uma empresa para se trabalhar, geralmente buscamos identificar a cultura da mesma através do padrão de características de sua origem tais como: empresa nacional, multinacional, familiar, originária de qual país, etc. Porém, além destas características que são observadas, como disse, por um padrão, a cultura de uma organização é composta por características únicas que não são tão facilmente identificáveis tão somente pela sua origem.
E então, muitas vezes, aquele velho ditado popular faz se real: “compramos gato por lebre”, quando escolhemos uma empresa para se trabalhar somente baseando-se nestes padrões.
Gostaria de abordar a cultura de uma empresa a partir da teoria de Edgar Schein sobre a Cultura Organizacional. Schein, psicólogo suíço, explicita que a cultura organizacional de toda empresa é subdividida em três níveis, conforme abaixo:
Nível dos Artefatos, Comportamentos e Produtos. Este é um nível visível da organização, onde qualquer pessoa que esteja inserida nela, ou mesmo fora dela, pode observar como as ela se comporta. Neste nível entram questões como uso do uniforme, rituais, comemorações, piadas, etc. É um nível que considero mais acessível e observável.
Normas e Valores. Aqui começam a surgir as normas de conduta e valores que permeiam a organização. Geralmente podemos identificar as normas e valores de uma organização de uma forma mais objetiva, através de sua visão, missão, valores e código de conduta, processos que geralmente estão descritos na organização e buscam retratar como ela funciona e o que se espera de quem trabalha pra essa organização, quais são os comportamentos e valores esperados destes indivíduos.
Assunções Básicas. Este é o nível mais inconsciente da organização. Aqui se observam os comportamentos, regras e crenças que estão enraizadas na organização e em seus indivíduos, e que os próprios geralmente não as percebem. São comportamentos já integrados à dinâmica da organização e estão enraizados profundamente. Neste nível encontram-se alguns modelos de comportamento que geralmente quem vem de outra empresa percebe, mas quem já trabalha nela há algum tempo acha que faz parte do cotidiano, e acaba não percebendo.
Agora, porque estes níveis de cultura são importantes para sua escolha profissional?
Por um simples motivo: eles impactam diretamente na sua satisfação no trabalho, se a empresa demonstra de fato valores que vão ao encontro dos seus, a probabilidade de você ter sucesso e satisfação profissional é maior.
Vamos a um exemplo prático. Você está em busca de uma oportunidade profissional na empresa X, e no momento que é chamado para a entrevista, a primeira coisa que faz é realizar uma busca na internet para saber mais sobre a empresa, conhecer seus valores, missão, visão, aonde aquela empresa quer chegar, e nela você encontra valores relacionados a equilíbrio da vida pessoal e profissional, com os quais você se identifica de prontidão, adquirindo mais informações sobre o nível cultural das Normas e Valores. O dia da entrevista tão esperada chegou, você chega na empresa, percebe que os profissionais da portaria vestem uniforme, possuem um padrão de atendimento, parecem trabalhar em um clima de harmonia quando você observa a forma que o vídeo institucional é passado na portaria, bem, você aqui já adquiriu mais informações do nível dos Artefatos, Comportamentos e Produtos. Foi uma ótima entrevista na sua percepção, o que despertou um interesse enorme em trabalhar na empresa, e eis que você encontra um colega que trabalha lá na empresa X, e decide perguntar como é trabalhar lá. O colega que trabalha na empresa X te conta que é realmente uma empresa muito boa pra se trabalhar, que a cada meta que você supera, seu bônus aumenta, que ele procura trabalhar das 8:00 às 22:00 para atingir essas metas e aumentar seu bônus, que os chefes reconhecem mais quem faz horas extras todos os dias. Talvez pela sua cara de espanto, seu colega ainda te conta que não é preciso se preocupar, que estas horas diárias a mais são computadas em um banco de horas que você tem disponibilidade de usufruir quando quiser, pois é norma da empresa. Quando você pergunta a seu colega quando foi a última vez que ele usufruiu de seu período de horas do banco, ele busca na memória e se recorda que foi no Natal do ano anterior, pois ‘o pessoal não costuma tirar essas horas, pois pega mal com o chefe’. Esse é um típico exemplo de comportamento que está no nível das Assunções Básicas.
Desta forma, embora muitas vezes uma organização pregue em seus valores que ela preza pela qualidade de vida, equilíbrio entre vida pessoal e profissional dos colaboradores, relações hierárquicas acessíveis e bom clima de trabalho, é no nível das Assunções Básicas que você realmente pode perceber de fato como uma organização funciona.
Antes de buscar uma posição em determinada organização ou área, busque conversar com algumas pessoas que trabalham há algum tempo neste local para compreender ‘as regras não visíveis’ presentes no dia a dia, e se elas estão de acordo com o que você está buscando e poderão te proporcionar satisfação no trabalho. Reflita sobre fatores que são fundamentais para esta tomada de decisão em termos da cultura organizacional, tais como: clima organizacional, relações hierárquicas, fluxo da tomada de decisão, ações de reconhecimento, diversidade, turn over voluntário, oportunidades de desenvolvimento profissional e equilíbrio entre vida pessoal e organizacional.
Da mesma forma, é importante que cada organização busque deixar cada vez mais claro como as coisas funcionam e que tipo de comportamento espera dos profissionais que trabalham nela, através de gestores e sua respectiva conduta, e, por exemplo, através de depoimentos de colaboradores sobre como é trabalhar naquela empresa, assim terá a oportunidade de ser mais assertiva em relação ao grupo de pessoas que fazem parte dela.
Lembre-se, não existe cultura certa ou errada, pois ela é construída a cada dia a partir de todos que trabalham na empresa, principalmente por quem está à frente dela e sua equipe de gestores. Porém, existe a cultura da qual você quer fazer parte ou não, aquela que vai ao encontro de seus valores e que te traz um sentimento de pertencimento na relação que o profissional busca com uma empresa.
E existem dois pontos que acredito que devemos estar sempre atentos em relação à nossa área profissional:
1 – Nós mudamos enquanto ser humano, nossas prioridades e necessidades evoluem ao tempo que amadurecemos e talvez, em certo momento de sua carreira, seu foco seja uma empresa em que os projetos e desafios sejam sua prioridade, talvez, em certo momento de sua vida, sua família e qualidade de vida possam ser uma prioridade, assim como um ambiente empresarial que te proporcione espaço para isso;
2 – Sempre seja um observador de si mesmo dentro do ambiente organizacional. Se questione, até que ponto os comportamentos que tenho são meus ou são da empresa, será que não posso estar cego em relação a algum ponto? Pense em formas de manter sua autenticidade e ao mesmo tempo se relacionar de forma saudável com a cultura da empresa na qual trabalha.
Reflita sempre, enquanto ser humano, profissional e pessoal, e busque sempre um sentimento de pertencimento e identificação com ambiente no qual você passa a maior tempo de seu dia, pois será maior a probabilidade desta relação ser duradoura e satisfatória, para você e para a empresa, quando você se questiona e sabe o porquê você quer pertencer àquele lugar.
Até logo!
Sabrina Green, Psicóloga, Coach certificada pela International Coaching Community e especialista em Recursos Humanos.