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O perdão precisa ser 100%?
por Sabrina Green

Todos já passamos por situações de mágoa, rejeição e ferimentos, sejam eles físicos ou psicológicos. Porém, você já refletiu se seu perdão foi 100%? Ou se 50% do caminho andado neste processo de cura da ferida já foi suficiente para te libertar do peso da raiva e dor? 

 

Eu sempre acreditei que perdão ‘de verdade’ tinha que ser 100%, não tinha meio termo nessa história de perdoar e esvaziar a dor do coração. Descobri através da psicanalista junguiana Clarissa Pinkola Estés que é praticamente impossível um perdão 100%, e que 60% de perdão acompanhados de 40% de “não sei, não tenho certeza e ainda estou pensando nisso” já são uma atitude satisfatória e potencialmente libertadora. 

 

Mas vou contar melhor aqui para vocês os conceitos que ela elabora sobre este assunto tão profundo e incômodo. 

O perdão é um processo que possui muitas camadas, não é algo que simplesmente se decide e “acontece”. A raiva e fúria por alguma ferida levam certo tempo para serem limpas da nossa psique, digo isso principalmente de uma forma profunda, e não superficial.

 

E enquanto não está limpa, vai prendendo a vida da pessoa de diferentes formas muitas vezes sem perceber: uma camada de cinismo, um cansaço que não passa, frustrar um futuro promissor, são comportamentos que vão “segurando” a vida da pessoa aos poucos.

 

Então, se você ainda se maltrata por não deixar essa energia fluir, segue abaixo os 4 estágios do perdão que Clarissa comenta para que você possa identificar onde se vê neste processo, e então trabalhar para deixar fluir o que for necessário e no tempo certo: 

 

1 - Deixar passar: para se conseguir perdoar é necessário primeiramente deixar algum tempo passar, como se fosse um período de ”férias” que você decide tirar sobre o assunto. Não é o mesmo que uma negação do mesmo, mas um momento de se fortalecer e trazer alegria à sua vida, pois pensar o tempo todo no assunto, dor e raiva derivado, traz um enorme desgaste psíquico. 

 

2 - Controlar-se: aqui entra o momento de amor próprio e não punição de si mesma. É nesta hora que se direciona a energia para um único ponto, com paciência. É um momento de compaixão, de ir diminuindo o torpor, a emoção da raiva destinada ao assunto. Você dá o primeiro passo para voltar a pensar naquilo ou em quem te feriu, mas vai começando a gerenciar o tamanho da emoção associada, diminuindo-a aos poucos. 

 

3 - Esquecer: sabe quando ficamos ‘repisando’ o assunto? Pois bem, chegou o momento de deixar ir, de fluir, um esquecimento consciente e não reprimido, é deixar sair do palco, lembrar que quem ou o quê te feriu não precisa estar no palco central de sua vida e ser trazido à memória a todo momento. Aqui é importante lembrar que esquecer é uma atividade e não uma atitude passiva, significava ter determinação para abandonar a repetição obsessiva e deixar a situação ser perdida de vista, sem olhar para trás. Quando vem aquele pensamento com a repetição da cena em sua cabeça, é com a determinação que você vai começar a deixá-la ir, pois a dor não precisa ser o foco de sua vida, você pode conscientemente fazer essa escolha. 

 

4 - Perdoar: é uma decisão consciente de deixar de abrigar o ressentimento, ou seja, sentir a dor de novo e de novo toda vez que lembra do que ocorreu. E é você que decide quando e qual será o ritual para assinalar esse momento, você é livre para fazer essa escolha. Pode ser perdoar por enquanto, até a próxima vez, não dar outra chance, dar muitas chances, perdoar uma ofensa toda, parcialmente ou pela metade. Você escolhe. Aqui não tem julgamento, certo ou errado, 100% ou 50%, você que decide o que e o quanto é necessário neste ‘rito’ do perdão. 

 

E aqui, quando falo de perdão, gostaria de ressaltar que digo de algo, alguém e também de si mesmo, pois o peso é muito maior quando não nos perdoamos. 

 

E como você vai saber que realmente perdoou?

 

Quando lembrar do tema, momento ou pessoa e passar a sentir tristeza ao invés de raiva, você não espera por mais nada desta pessoa ou situação, você está livre para ir e vir. Livre. 

 

Então chega aqui meu convite para o momento de reflexão:

o que ainda preciso perdoar? O que já foi o suficiente para deixar ir e fluir? O que posso deixar pelo caminho sem esperar mais nada? 

 

Talvez não haja uma perfeição em perdoar 100%, mas sim haja uma perfeição em perdoar na medida do necessário para a libertação da energia da raiva, para dar o devido lugar no coração do que passou, para que se abra espaço para os aprendizados e possibilidades que vão além da dor, pois ainda existe um mundo a ser vivido e agora, com a experiência destas cicatrizes, sinais de que a vida foi vivida e escolhida. 

 

Te convido a ler o texto completo da Clarissa, no capítulo A demarcação do território: os limites da raiva e do perdão, ele faz parte do livro Mulheres que correm com os lobos.  

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Sabrina Green

é Consultora de Desenvolvimento Humano e Organizacional, Psicóloga e Coach pela ICC.
https://www.greenintegral.com.br
sabrina.green@greendh.com.br